sexta-feira, 9 de março de 2018

GENTE ANÓNIMA COM HISTÓRIA


                                                          
             Continuam no ar os ecos desta semana da Mulher, repercutem-se as memórias da quinzena do Ano “33”  e reimprimem-se no chão desta sexta-feira as pègadas da Via Dolorosa de Jerusalém. É neste imenso triângulo que vou unir os vértices tridimensionais desta crónica, entrelaçando-os numa repetida homenagem àquelas que nunca entraram na ribalta dos media, mas têm muito que contar.
         Ontem e hoje, nas redes comunicacionais da praça pública, cumpriu-se o costumeiro protocolo de estampar nas primeiras páginas o friso de mulheres famosas, todas elas consagradas e aureoladas no panteão da glória: escritoras, protagonistas do mundo da arte e do espectáculo, empreendedoras, ‘primeiras damas’, enfim, as semi-deusas que “da lei da morte” se vão libertando.
         Pois hoje escolhi mergulhar no bojo da história, como quem volta ao seio materno, para encontrar as raízes milenares de todos os tempos – do passado, do presente e do futuro – e trazê-las ao sol da manhã para que o seu brilho, de ouro fino, resplandeça diante dos nossos olhos. São as mulheres anónimas, gente do Povo, genuínos exemplares de uma feminilidade feita de amor e ânimo, doçura e fortaleza, telúrico encanto e força motriz que arrasta gerações. Tal como o veio de água que silenciosamente irriga a terra, faz florir os campos e alevanta, sempre silenciosamente, os imponentes castanheiros, assim são elas: envoltas nos seus xailes antigos, imperceptíveis quando passam, até de mãos e peles enrugadas, mas diligentes, criativas, poderosas na sua acção laboral e pedagógica.
Louvo as mulheres dos pescadores, autênticas líderes em terra, que na ausência do marido, organizam a empresa doméstica da alimentação e da educação dos filhos. Quantas vezes vi eu no seu dinamismo diário a concretização inteira do pensamento de Jean Guitton: “Um mulher doméstica pode demonstrar tanta ciência económica e tanta intuição governativa como um ministro das Finanças”!
         Louvo no mesmo pedestal as mulheres de emigrantes que viram os maridos partir para longe (como os refugiados de agora) e tomar o comando da casa, dos campos, da rega, da cava dos terrenos, sem descurar a manutenção da organização familiar, os filhos à escola, a ida aos médicos. Aí é que eu via  e vejo a mulher, no seu dúplice trabalho de ser mãe e pai ao mesmo tempo.
Louvo as mulheres bordadeiras, (as mesmas que acabei de citar) que alimentavam a família com o ponto da agulha até às quatro e cinco da manhã e com o cheiro  dos candeeiros a petróleo, que se lhes pegava à roupa e aos pulmões. Louvo-as, ainda, junto ao lar da cozinha, preparando as refeições, cumprindo aquela nobre missão: “É tão belo descascar batatas como construir catedrais”
Louvo estas e outras mulheres que, desde há 33 anos, vêm defendendo a sua terra, o templo que o Povo construiu e sobretudo a  honra e a liberdade da sua ‘pátria rural’. Vi-as também nas lutas contra os senhorios. Foram elas, corajosas que exigiram à PSP que soltasse os maridos presos-à-força, aquando da ocupação da igreja da Ribeira Seca, há 33 anos! Impossível esquecer o sacrifício dessas mulheres, na altura do bombismo da “Flama”, nos finais da década de 70 do século passado, as quais fizeram uma escala diária de vigilância e vinham durante o dia  bordar no adro (os homens faziam o turno da noite) para contrariar   as ameaças dos “flamistas”.
Louvo-as - a essas e a todas as  valorosas mulheres - que, sendo anónimas para a ribalta da fama mundana, são elas o suporte das sociedades, cada qual na sua profissão. E recordo a sua alegria participativa nas festas  do Povo com versos originais cantados nas romarias, como estes que recorto, a título de exemplo:

O 25 de Abril                                     Viva o Povo que trabalha
Foi um dia de alegria                           E dá toda a produção
Portugal entrou de novo                      Ele um dia há-de vencer
Na Divina Eucaristia                             E mandar toda a nação

09.Mar.18
Martins Júnior        

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