terça-feira, 27 de junho de 2017

SOLIDARIEDADES PÓSTUMAS --- SUCESSOS E DESAFIOS

Dobrado sobre o escantilhão dos caracteres gráficos, aqui de longe, escrevo à mesma hora em que Lisboa, dentro e fora do  Meo Arena, transborda de sons e tons quentes, solidários – daquela solidariedade que transforma as cinzas em generosas fogueiras, maiores que os incêndios que devoraram cinquenta mil hectares de terra beirã. É o  genuíno animus lusitanus, coração pátrio, pronto e  aberto à desgraça quando esta  nos bate à porta. São as instituições, são os grandes bancos, com o BCE `na vanguarda, são as igrejas, os padres e os frades, os cidadãos anónimos que correm pressurosos a amparar os desvalidos, os imigrantes do lume, foragidos dentro da sua própria casa. Aproveita-se a hora para tocar a rebate  com o badalo de grandes dádivas na comunicação social. E a sociedade toda, pela boca do Presidente da  República, exclama como que num assomo de requintado narcisismo. “Não há gente como esta”!
Louvo a capacidade regeneradora do Povo Português em toda esta tragédia, enquanto me deixo envolver na manta de lágrimas e retalhos das  vítimas e suas inconsoladas famílias. No entanto, desde as frágeis da orelhas do cidadão comum até às velhas muralhas das arribas, o que mais troa no ar é um simples e poderoso trissílabo: PRE-VEN-ÇÃO. Repetem até à exaustão  investigadores e ambientalistas  que é na prevenção que está o ganho, porque mais que remediar,  o que  vale é prevenir. Esboçam-se planos e traçam-se programas em conformidade: faltam guardas florestais, é urgente restaurá-los; os pobres bombeiros ganham pouco e não têm arsenal suficiente para combater os incêndios; não há quem limpe as matas e “a floresta é o nosso futuro”.  São estas as notas que perseguem governantes e governados, notas mais graves e mais agudas e todas mais gritantes que os acordes do mega-espectáculo desta noite no Meo Atena.
No entanto, passadas que forem mais meia-dúzia de luas, quem se lembrará disso?... Sem querer entrar, hoje, em aspectos parcelares da questão, ouso perguntar: Estarão os mesmos banqueiros, as mesmas instituições de benemerência, as mesmas igrejas e congregações na disposição de contribuir para a Prevenção, com os mesmos valores (ou em 50%)  do que deram para a Remediação?... Duvido.  O que mais se ouvirá  é o estafado e estouvado  bocejo: “Isso é lá com o governo”.  Criou-se passivamente  um inconcebível paradigma fiscal que se resume a isto: Prevenir é com o governo, Remediar é com o Povo! Como se Prevenir não fosse  o dobro, o triplo, o quádruplo de Remediar… Toca-se aqui o nervo mórbido da condição humana, infiltrado e cozido bem dentro de nós, quando acompanhamos religiosamente o funeral de alguém a quem pouca ou  nenhuma atenção prestámos no decurso da sua atribulada vida.
Gostaria de dissecar mais aprofundadamente este paradoxo, no que concerne aos incêndios e às intempéries. Mas deixo-o, por agora, para não empanar o brilho do dadivoso gesto dos 25 artistas, “Todos Juntos por Petrógão Grande”. Um milhão e duzentos mil euros!!! Merecem o maior aplauso. Como o merecem todos aqueles que, dentro ou fora das ONG’s, lutam persistentemente, no silêncio de todos os dias, pela defesa  do ambiente, esta nossa “Casa Comum”,  onde o Homem possa respirar o ar puro da Segurança e da Saúde.
Mais vale a Solidariedade viva da Prevenção  do que a Solidariedade póstuma da Destruição.

27.Jun.17

Martins Júnior   

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