quarta-feira, 19 de novembro de 2014

A MALDIÇÃO DA POLÍTICA “A mais velha profissão do mundo”


Nem é  comentário nem apreciação nem crítica o que me move neste nosso convívio de fim-do-dia. Porque para  ocupar-se do currículo quotidiano da praça pública,  há analistas de sobejo,  comentadores profissionais, enfim, os boletineiros de serviço diário. Hoje é um desabafo, um misto de indignação e de náusea perante este nó de víboras em que nos trazem enredados os protagonistas da nação e das nações, ébrios de poder e de caça limpa. Refiro-me aos escândalos que todos os dias conspurcam os nossos televisores e infestam de ar pútrido as paredes da nossa casa. Citá-los põe-me a cabeça em cacos:  são os Bárcenas, os Pujol aqui ao lado; são os angolanos, agora os timorenses, os chineses, e  aqui na vizinhança os BES e os BESAS,  os SEFs, os garantes das escrituras notariais, para já não falar nesta cirurgia plástica, à moda caseira, que deu pelo nome de Cuba Libre à nossa porta. Mas que maldição é esta que ataca todos os que caem no labirinto da política?!... Todos não, mas quase sempre os mesmos, da mesma raça. E vejo isto com tanta mais abjecção quanto o saber que também  andei por perto dessas raias de maldição.  Parece  que entrar para a política é sinónimo de entrar para a prostituição, tal como no tráfego de seres humanos onde os proxenetas angariam jovens e adolescentes, prometem-lhes bons empregos em tais ou quais cidades e depois, atónitas, vêem-se mergulhadas no pântano do açougue degradante da mais vil condição feminina.
É o que se tem visto: gente proba, com provas dadas, técnicos competentes, isentos e seguros,  por quem antes se era capaz de pôr as mãos no fogo e, depois, desabam as torrentes e vê-se-lhes a mais repugnante nudez de carácter.
Penso em Dante Alighieri quando no frontispício do Inferno (da sua “Divina Comédia”) coloca o terrífico cartaz aos que lá chegam: ”Deixai fora toda a esperança,  ó vós que entrais!”. Parece que a todos os candidatos a cargos públicos ou de confiança política se impõe idêntico anátema: Deixai fora toda a dignidade, trocai de roupa e de alma, calcai aos pés o brio da honestidade que os vossos pais vos ensinaram.
É a vertigem do abismo da corrupção, a que eles chamam a atracção pela soberania, perante as quais ficam drogados e cegos, capazes de todos os truques, de todas as manobras, qual delas a mais sofisticada. Nem ao menos  pensam que têm amigos dignos, filhos e netos que no dia seguinte são marcados e enxovalhados pelos colegas da mesma escola!
Maldição da política!
Mas o zé-povo ( o zé-povo somos nós!) também tem culpa. Para alcançar vantagens a qualquer preço não hesita em subornar o polícia, o cobrador de impostos, o presidente e, se puder, o juiz. E na escala inversa o zé-povo também se paga:  é o porteiro que dá prioridade a quem não a tem, é o amanuense, o oficial de diligências que, a troco de uma nota, puxa o processo para  cima da mesa,  é o contínuo que imita o secretário e também espera a sua garrafa de whisky. É a  maldição que se faz enguia subtil  e percorre as veias do circuito hierárquico, desde o marechal ao soldado raso, desde o Papa (menos o Francisco) até ao sacristão.
Sei do que falo e lembro o meu primeiro Natal como  presidente do município:  quinze dias antes da “festa”, confrontei-me com uma bem alinhada brigada do reumático que subia a escadaria da Câmara, com sacos e mais sacos: “Sr. presidente, isto é o meu patrão que lhe manda as boas-festas”.  “Tira-me esse lixo daí, desaparece”, era a minha resposta, enquanto via o formigueiro descer escada abaixo, surpreendido e envergonhado. “Mas sempre foi assim todos os anos”, desculpavam-se alguns. Afinal, os portadores não tinham culpa, eram mandados.
O que se tem visto nos noticiários  revolta, indigna, enoja. Por vezes apetece cambiar o ditado que se designa pela “mais velha profissão da humanidade”. E, pelo que se vê, não estaria fora do risco quem dissesse que essa profissão é a política que desfila diante dos nossos olhos. Até nos próprios jotas que, calculistas e serventuários carreiristas, se tornam aprendizes da mais antiga profissão.
Desculpem este desabafo. Mas não suporto mais.

N.B. -- Uma saudação calorosa aos dois funcionários da limpeza da Póvoa de Varzim que, tendo achado na recolha do lixo uma carteira com 4.500 euros, foram entrega-la à Câmara Municipal para devolvê-la ao seu dono.
Estes, sim, é que merecem pertencer à estirpe dos verdadeiros políticos.

19.Nov.14

Martins Júnior

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